
Ontem (5), Dia Mundial do Meio Ambiente, fez três anos que o indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram assassinados na região do Vale do Javari, entre os municípios de Guajará e Atalaia do Norte, no oeste do estado Amazonas.
Eles voltavam de barco de uma visita aos indígenas Marubo em direção a Atalaia do Norte, quando foram interceptados por criminosos que atuavam na pesca e caça ilegais na região.
Para marcar a data e manter viva a memória dos dois e de todos os que morreram defendendo a floresta e os povos originários, a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) e mais de 40 organizações indígenas e socioambientais, entidades de imprensa e da sociedade civil lançaram o manifesto Três anos sem Bruno e Dom.
O texto foi organizado pela Univaja, com apoio da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e do Instituto Dom Phillips, e vai além: também exige ações concretas para garantir a proteção dos guardiões da floresta.
Familiares, ativistas e organizações também cobram respostas do Estado e garantias de que esse tipo de crime não se repetirá e que a justiça será feita por Bruno e Dom. Para os povos do Vale do Javari, o compromisso é claro: a floresta ficará em pé.
Segundo o advogado Eliésio Marubo, vinculado à Univaja, a atuação do governo federal no Vale do Javari tem deixado a desejar e o nível de criminalidade nos municípios de Atalaia do Norte, Benjamin Constant e Tabatinga, em torno da TI Vale do Javari, só piorou, atingindo um estágio talvez irreversível. Um conjunto de fatores – crime organizado, a pesca e a caça ilegais – parece de difícil solução.
“Continua acontecendo invasão tal qual naquele momento pretérito, do Bruno e do Dom. O fortalecimento dos órgãos é importante. Se isso não acontecer, vai continuar chovendo no molhado, enxugando gelo”, disse ele em entrevista à Agência Brasil esta semana.
O indigenista Bruno Pereira era servidor licenciado da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e atuava como consultor técnico da Univaja em ações para reduzir a pesca e a caça ilegais no território indígena. Era considerado um dos maiores especialistas do país em povos indígenas isolados ou de recente contato.
Bruno e Dom
O indigenista Bruno Pereira era servidor licenciado da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e atuava como consultor técnico da Univaja em ações para reduzir a pesca e a caça ilegais no território indígena. Era considerado um dos maiores especialistas do país em povos indígenas isolados ou de recente contato.
Já o jornalista Dom Phillips era comprometido com a luta pela proteção da Amazônia e estava escrevendo um livro-reportagem sobre a região, misto de diário de viagem, investigação jornalística e manifesto, lançado no mês ado: Como Salvar a Amazônia: uma busca mortal por respostas.
Apenas quatro capítulos dos oito que integram a obra foram terminados pelo autor. O trabalho foi concluído por nove amigos e colaboradores do jornalista – entre eles Eliane Brum e Jon Anderson -, que se reuniram para refazer entrevistas e expedições pois o material colhido por Dom foi perdido com sua morte.
O caso, hoje
Concluída em novembro de 2024, a investigação da Polícia Federal indicou que o crime foi motivado para impedir atividades de fiscalização no Vale do Javari.
Rubén Dario da Silva Villar, conhecido como “Colômbia”, foi indicado como mandantee acusado de tráfico de drogas e de chefiar uma organização criminosa que pratica pesca e caça ilegais.
O inquérito da PF também indiciou oito pessoas por participação no assassinato, mas nem todos os nomes foram divulgados. Em 2022, três delas haviam sido denunciadas pelo Ministério Público Federal como executoras das mortes: Amarildo da Costa Oliveira (“Pelado”), Oseney da Costa de Oliveira (“Dos Santos”) e Jefferson da Silva Lima (“Pelado da Dinha”). Eles foram acusados de duplo homicídio qualificado e ocultação de cadáver.
Os réus confessos, Amarildo e Jefferson, seguem presos e aguardam julgamento por júri popular. A Justiça rejeitou a acusação contra Oseney por falta de provas, mas o MPF recorre ao STJ para que ele também vá a júri.
O manifesto na íntegra

Três anos sem Bruno e Dom
“Bruno e Dom estão presentes em quem protege as florestas, no silêncio resistente de quem cuida da terra, no gesto de cada um que, mesmo diante do medo, escolhe a coragem.
Hoje, neste 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, três anos após a tragédia no Vale do Javari, não lembramos apenas dois nomes — lembramos de uma causa. De uma luta. De uma promessa: a de que a floresta ficará de pé. De que os povos indígenas viverão com dignidade, respeito e liberdade.
As vozes e as ideias de Bruno e Dom não foram silenciadas. Elas ecoam na história de Maxciel Pereira dos Santos. Ecoam na luta de Ari Uru-Eu-Wau-Wau. Na fé e bravura de Dorothy Stang. Na memória viva de Emyra Wajãpi, Mãe Bernadete e Chico Mendes e tantos outros que morreram lutando.
Neste ano em que o Brasil se prepara para sediar a COP30, o mundo nos olha. E nós exigimos mais que promessas. Exigimos proteção para os guardiões da floresta. Exigimos ações reais, urgentes e transformadoras.
Bruno e Dom estão presentes em cada palavra livre, em cada reportagem corajosa, em cada ato de resistência, em cada defesa da democracia, dos direitos humanos e da liberdade de imprensa.
Hoje, recordamos de Bruno e Dom com dor, mas também com orgulho. Porque o que eles fizeram não foi em vão.
Bruno e Dom, presentes!”
Assinam:
- Instituto Dom Phillips (IDP)
- Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI)
- União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja)
- Nia Tero
- Rainforest Foundation Norway (RFN)
- Repórteres Sem Fronteiras – RSF
- Justiça Global
- Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
- ARTIGO 19 Brasil e América do Sul
- Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ)
- FNDC – Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação
- Instituto Tornavoz
- Washington Brazil Office
- Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo – Abraji
- Observatório do Clima
- Instituto Raoni
- Instituto Kabu
- Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB)
- Centro de Trabalho Indigenista (CTI)
- Frente Ampla Democrática pelos Direitos Humanos (FADDH)
- Célia Xakriabá (deputada federal)
- Rubens Valente (jornalista e escritor)
- Vozes do Planeta/ Paulina Chamorro (jornalista)
- Associação do Povo Indígena Zoró (Apiz)
- Cooperativa de Produção do Povo Zoró (COOPERAPIZ)
- Grupo Tortura Nunca Mais – SP
- Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Mato Grosso
- Eunice Dias
- Fórum Grita Baixada
- Urihi Associação Yanomami
- Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública
- Rede de Estudantes Indígenas do Vale do Javari (REIVAJA)
- Neidinha Suruí (indigenista)
- Instituto Kanindé
- Instituto Terra
- Associação Wakoborũn
- Movimento Munduruku Ipereğ Ayũ
- Associação Pariri
- Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé)
- Rede de Cooperação Amazônica (RCA)
- IEB – Instituto Internacional de Educação Brasil
- Instituto Vladimir Herzog
- Comitê para a Proteção de Jornalistas (J)
- Instituto Socioambiental (ISA)
- Coalizão em Defesa do Jornalismo (CDJor)
- Instituto Sociedade População e Natureza
- Comissão Pró Indígenas do Acre (I-Acre)
- Associação Floresta Protegida do povo Mebengôkre – Kayapó
- eAmazonia – Inovação para o Clima
- Eco Universidade
- Jess Tenório (artista gráfica)
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Com informações da Abraji e Agência Brasil
Fotos: Funai (montagem) / divulgação